Page 8 - v1_pt

This is a SEO version of v1_pt. Click here to view full version

« Previous Page Table of Contents Next Page »
Durante os reinados de D. João II (1481-1495) e D. Manuel I (1495-1521), ocorreu a primeira
emergência do absolutismo régio português e uma nítida evidenciação do poder do Rei, com as
consequentes modificações ao nível da imagética mental e da iconografia régia 50 . Todo o poder instituído
gera a sua própria imagem, que procura ser instrumento de legitimação e de reforço desse poder.
Ora, D. Manuel, que era duque de Beja, subiu ao trono após sete mortes de personalidades que
o precediam no direito à sucessão, pelo que tinha de se afirmar perante uma corte habituada a vê-lo
como duque. Assim, todas as iniciativas do seu reinado, nas quais se inclui a produção cultural, foram
marcadas por símbolos tradicionais do poder régio português e outros que o significam a ele próprio 51
(Fig. 9).
As armas reais
Entre esses símbolos destacam-se o conjunto escudo real-coroa,
como que constituindo um objecto único, e a esfera armilar. O diadema
da coroa apresenta sempre jóias: rubi central, talhado em redondo, com
uma esmeralda, talhada em lisonja, de cada lado, de novo dois rubis, e
entre eles cinco pérolas, ou cada jóia é rematada por quatro pérolas 52 .
Podem, no entanto, aparecer outras pedras como a safira e, mais raramente,
o topázio. Para Marcello Moraes, o diadema, de ouro, apresenta virolas na
parte superior e inferior e pedraria entre elas: quatro esmeraldas em
formato de rectângulo e quatro rubis em losango, sendo visíveis duas
esmeraldas e três rubis, montadas em engastes separados por pérolas.
É rematado superiormente por oito florões de folhas de acanto trilobadas,
de ouro, com uma pérola ao centro de cada um, sendo aparentes cinco,
tendo colocadas entre cada, uma pequena haste rematada por uma pérola,
sendo aparentes três; tudo fechado por oito hastes, também de ouro,
ornadas por pérolas, sendo aparentes cinco, e encimadas no ponto de
cruzamento pela orbe com a cruz 53 .
Com D. Afonso III surgiu a primeira grande alteração das armas reais
portuguesas 54 com o aparecimento da bordadura de vermelho carregada
de castelos de ouro, das armas reais de Castela, por sua mãe a rainha
D. Urraca, filha do rei de Castela.
D. Afonso III, secundogénito de D. Afonso II, usou a bordadura para
diferençar as suas armas das de seu irmão primogénito, D. Sancho II, ainda
vivo.
Esta explicação, avançada primeiro por Armando de Mattos 55 , é
seguida mais tarde pelo marquês de São Payo e corroborada por D. Faustino
Menendez Pidal 56 .
Também o número dos castelos da bordadura variou ao longo do tempo. Dependendo inicialmente
de quantos coubessem naquele espaço, manteve-se em sete a partir de 1558 57 .
Os castelos apareceram pela influência das armas dos reis de Castela nas diferenças das armas
dos seus descendentes, não só portugueses, mas também leoneses, castelhanos, franceses e aragoneses.
De notar que esta “diferença” se vai manter nas armas reais.
Com a subida ao trono de D. João I, e até D. João II, as armas reais portuguesas ostentaram a
cruz verde flordelisada, insígnia da Ordem de Avis, de que D. João I era Mestre, e que por isso mesmo
deveria ter sido retirada após a sua morte por se tratar de um atributo meramente pessoal. Tal não
aconteceu até D. João II, o qual ordenou a sua retirada e a colocação dos escudetes laterais em pala.
Dada a notícia desta forma simplista por Rui de Pina e Garcia de Resende, que o transcreve, sem
o citar, é lícito perguntar com Tovar de Lemos: “Quem poderia hoje suspeitar que a reforma do brasão
das armas reais requerida nas cortes de 1482, pelos Procuradores dos Povos que logo ali apontaram
algumas modificações que era conveniente introduzir, foi o resultado de três anos de acalorados debates?;
Que para pôr ponto final a estas intermináveis discussões, D. João II resolveu, em 1485, limitar a reforma
do brasão aos dois pontos já conhecidos: eliminação da cruz de Avis e alteração da posição dos escudetes
laterais das quinas?” 58 É esta intervenção pessoal do Rei que confirma a sua convicção de que as armas
são do Estado e não da Família Real, pelo que pode dizer-se que a noção de armas de Estado em Portugal
começou em 1485.
A referência heráldica oficial mais antiga que se conhece de o escudo de armas de Portugal estar
colocado sobre a esfera armilar, embora sem continuidade, data do século XVII, reinando D. Afonso VI 59 .
Já no século XIX, ela surgiu de novo, na sequência da legislação que criou as armas do Reino Unido de
Portugal, Brasil e Algarve, após criação do Reino do Brasil por Carta de lei de D. João VI de 13 de Maio
de 1816 60 . Na nova ordenação que se manteve até à independência do Brasil, o escudo de armas de
Portugal assentou sobre uma esfera armilar de ouro (sem o seu suporte) com o campo de azul (brasão
de armas outorgado ao reino do Brasil).
50 Alves, 1985, p. 13.
51 Idem,
ibidem
, p. 15.
52 Idem,
ibidem
, p. 113.
53 Moraes, 1995.
54 Mattos, 1939, p. 75.
55 Norton, 2004, vol. I, pp. 307-308.
56 Idem,
ibidem.
57 Mattos,
ibidem
, p. 88.
58 Tovar, 1932, pp. 17-25.
59 Norton,
ibidem
, vol. I, pp. 314-315.
60 Idem,
ibidem.
Fig. 9. D. Manuel I (pormenor),
Página do Prólogo da
Crónica de
Dom Afonso V
, n.º 17
© ANTT/José António Silva
130 .
PORCELANAS DAS DINASTIAS YUAN (1279-1368) E MING (1368-1644)