Desde quase o seu início, as armas reais apresentaram, assentando no bordo
      
      
        superior do escudo, um coronel que, a partir de D. Sebastião, foi substituído por coroa
      
      
        real ou, por vezes, por coroa imperial 61 .
      
      
        A esfera armilar
      
      
        A esfera armilar foi a divisa concedida a D. Manuel por seu cunhado e antecessor,
      
      
        El-rei D. João II, coisa que pareceu de mistério e profecia, porque lhe deu a esperança
      
      
        de sua real sucessão 62 .
      
      
        “Empresas, tenções ou divisas são as (insígnias) que os reis, príncipes ou
      
      
        particulares tomam, conformando as figuras e letras com o desenho e pensamento
      
      
        que cada um tem para empreender coisas altas” 63 .
      
      
        Na realidade, a empresa é representada por um símbolo, geralmente acompanhado
      
      
        por uma legenda ou moto escolhido pelo próprio como farol orientador das suas acções
      
      
        e da sua vida.
      
      
        Diz ainda El-rei D. Duarte que à semelhança da “própria pessoa, que se entende
      
      
        alma e corpo”, também a empresa é formada por duas partes distintas: a alma e o corpo 64 . 
      
      
        A aceitação desta emblemática a partir da segunda metade do século XIV, e
      
      
        que atingiu o auge em Portugal e na maior parte da Europa no século XV, surgiu como
      
      
        reacção ao facto de as armas se terem transformado num sinal identificativo de toda
      
      
        uma linhagem, tendo-se perdido o seu carácter pessoal, como muito bem dizem
      
      
        Henrique Avelar e Luís Ferros 65 . Carácter pessoal que a empresa tem.
      
      
        A partir de 1504, D. Manuel associou sistematicamente ao escudo de Portugal
      
      
        as duas esferas que passam a constituir a sua divisa. A esfera apresenta cinco arcos
      
      
        paralelos – Equador, Trópicos de Câncer e Capricórnio e Círculos Polares Ártico e
      
      
        Antártico – sendo a profundidade sugerida por um meridiano desenhado em perspectiva e pela faixa
      
      
        correspondente à eclíptica. Esta é utilizada para nela se inscrever o nome ou as iniciais do monarca,
      
      
        por vezes com erros ortográficos, os signos do zodíaco ou 
      
      
        
          Spera in Deo 
        
      
      
        (Espera em Deus)... A esfera
      
      
        pode ocasionalmente estar mal desenhada, faltando-lhe ou sobrando-lhe um dos paralelos 66 . 
      
      
        A representação da esfera armilar, como nas gravuras das
      
      
        
           Ordenações Manuelinas
        
      
      
        , que substituíram o
      
      
        
          corpus
        
      
      
         legislativo afonsino, apresenta, por vezes, uma faixa com a alma da empresa: 
      
      
        
          Spera in Deo et fac
        
      
      
        
          bonitatem 
        
      
      
        (Confia em Deus e pratica o bem), expressão inspirada na sabedoria bíblica, remetendo-nos para
      
      
        o Salmo 36, versículo 3: “Espera no Senhor e faz o bem; habitarás a terra em plena segurança” (Fig. 10).
      
      
        A associação do poder de Deus ao poder régio faz-se normalmente pela presença de dois ou mais
      
      
        anjos ladeando o escudo, onde desempenham um duplo papel, o de figuras heráldicas, chamadas tenentes,
      
      
        correspondentes aos anjos custódios de Portugal 67 , e figuras celestes. Por vezes, há notações directas
      
      
        da presença divina: um anjo único; S. Miguel, o anjo de Portugal; Deus Pai que surge no céu; o tema
      
      
        régio dos evangelistas S. João e S. Lucas; o rosto de Cristo e o monograma IHS (Fig. 11).
      
      
        Por isso, não é de admirar que os símbolos do poder real e a presença divina apareçam associados
      
      
        também sobre as primeiras porcelanas encomendadas para o mercado português, certamente com
      
      
        61 Mattos, 
      
      
        
          ibidem
        
      
      
        , p. 95.
      
      
        62 Resende, 1973, pp. 70-71.
      
      
        63 Francisco Rodrigues Lobo, 1619,
      
      
        citado por Avelar e Ferros, 1983, 
      
      
        p. 227.
      
      
        64 Citado por Henrique Avelar e Luís
      
      
        Ferros, “As Empresas dos Príncipes
      
      
        da Casa de Avis”, in
      
      
        
           O Homem e a
        
      
      
        
          Hora são um só, A Dinastia de Avis
        
      
      
        ,
      
      
        Catálogo da XVII Exposição Europeia
      
      
        de Arte, Ciência e Cultura, Casa dos
      
      
        Bicos, 1983, p. 227.
      
      
        65 Avelar e Ferros, 
      
      
        
          ibidem.
        
      
      
        66 Alves, 
      
      
        
          ibidem
        
      
      
        , p. 129.
      
      
        67 Langhans, 1966, p. 40.
      
      
        Fig. 10. Gravura com as armas reais e a
      
      
        esfera armilar do frontispício dos
      
      
        Livros 1.º, 2.º e 5.º das
      
      
        
           Ordenações
        
      
      
        
          Manuelinas,
        
      
      
         edição de 1514
      
      
        © ANTT/José António Silva
      
      
        Fig. 11. Iluminura com a esfera armilar, 
      
      
        as armas reais portuguesas, anjos
      
      
        e jarra com o monograma IHS.
      
      
        
          Leitura Nova 6
        
      
      
        , livro 1 da Beira
      
      
        © ANTT/José António Silva
      
      
        PORCELANAS DAS DINASTIAS YUAN (1279-1368) E MING (1368-1644)
      
      
        
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